quarta-feira, 4 de abril de 2012

Reconstruindo o Marxismo - Eric O. Wright, A. Levine e E. Sober


Materialismo histórico clássico

Uma das principais contribuições de Marx foi uma proposta de Teoria da História, baseada no Materialismo histórico (MH).
O curso da história humana, para KM, pode ser dividido em uma série de períodos distintos, cada um deles caracterizado por um conjunto distinto de relações de propriedade e controle sobre os recursos produtivos, isto é, as relações sociais de produção.
As relações de produção explicam as propriedades essenciais das instituições políticas e ideológicas da sociedade, sua superestrutura, e são, elas também, explicadas pelo nível de desenvolvimento da tecnologia da sociedade e pela organização em geral do processo produtivo, suas forças de produção. O que dá à história sua direção é a estrutura causal que une as forças de produção, as relações de produção e a superestrutura.


O marxismo do século XX, em alguma medida, se opõe a algumas proposições de KM.

Materialismo histórico, diferente do pensamento dos marxistas do século XX:
- possui um caráter determinístico
- possui alto grau de abstração: os pensadores estavam mais interessados pelo papel da atividade humana (coletiva e individual) no que se refere à transformação da realidade
- oposição política, específica à realidade de cada região
- primazia causal da força sobre as relações de produção, sugerindo uma política economicista – neste sentido, há oposição por unanimidade (para KM, parece que a transformação social depende primeiro do desenvolvimento das forças produtivas, e somente então da transformação das relações de produção. Os marxistas ocidentais, ao contrário, procuram enfatizar a transformação das relações de produção, dando comparativamente pouca importância ao desenvolvimento das forças produtivas)

Assim como KM, entretanto, marxistas da II Internacional acreditavam que seria errada a construção do socialismo em países subdesenvolvidos quando da ausência de revoluções socialistas bem sucedidas nos grandes centros. A vitória dos bolcheviques na Rússia fez parecer que a estratégia deveria ser começar pelos países menos desenvolvidos.

Stalin e Trotsky: a transformação socialista deve primar pela política socialista que rege as forças produtivas da sociedade e seu desenvolvimento.

O pensamento marxista ocidental afastou-se da experiência russa das forças de produção (controladora, tecnocrática, autoritária, burocrática, centralizadora, coletivizadora, estatizadora). Também, em alguns momentos, afastou-se das posições assumidas pelo oficialismo marxista.

Por esses motivos, a maioria dos marxistas ocidentais se tornaram hostis ao materialismo histórico.

Obra de G. Cohen (GC) sobre a Teoria da História baseada no Materialismo Histórico:

GC acredita que há aspectos que devem ser considerados.

MH:
1- TESE DA PRIMAZIA (GC): o nível de desenvolvimento das forças produtivas, numa sociedade, explica o conjunto das relações sociais de produção, a “estrutura econômica”, dessa sociedade.
2- TESE DA BASE/SUPERESTRUTURA (GC): a estrutura econômica de uma sociedade, sua base econômica, explica as superestruturas.

GC: ambas as explicações são funcionais. O autor as compara com as explicações de BM nas ilhas Trobriand.

Fato disposicional: [RP => uso e desenvolvimento das FPs.]
Explicação funcional: [RP => uso e desenvolvimento das FPs] => RPs.
Tese da Primazia: Nível das FPs => [RPs => uso e desenvolvimento das FPs] => RPs.

Tese da Primazia:
Tese 1 (COMPATIBILIDADE): Um determinado nível de desenvolvimento das forças produtivas somente é compatível com um limitado alcance de relações de produção.
Tese 2 (DESENVOLVIMENTO): dado que as forças de produção tendem a se desenvolver através do tempo.
Tese 3 (CONTRADIÇÃO): as forças eventualmente alcançariam um nível em que elas não seriam mais compatíveis com as relações de produção existentes.
Consequencias:
- as RPs tolhem as FPs. O exemplo dado é que não haveria estabilidade entre uma sociedade escravista e tecnológica, pois seria necessário um grau de cultura alto para uma sociedade tecnológica.
Incompatibilidades entre FPs e RPs: de uso e de desenvolvimento

Premissas:
- seres humanos são racionais, no sentido de poderem se adaptar os meios aos fins
- seres humanos defrontam-se com uma necessidade coercitiva e trans-histórica de desenvolvimento das forças produtivas quando as forças são impedidas pelas relações, os seres humanos terão interesse em transformar as relações.
- este modelo só é válido em uma sociedade de classes, na qual há mais valia, investida no desenvolvimento das FPs.

Tese 4 (CAPACIDADE): existe a possibilidade de os seres humanos possuírem a capacidade de transformarem as RPs.
Tese 5 (TRANSFORMAÇÃO): podendo realizar a transformação das RPs para restaurar a compatibilidade entre FPs e RPs.
Tese 6 (OTIMAÇÃO): as RPs serão substituídas por novas RPs que sejam as melhores para desenvolver as FPs.

CONCLUSÃO: o MH sustenta que, a longo prazo, à medida que as compatibilidades forem estabelecidas ou restabelecidas, o mundo constituído pelas FPs e RPs será o melhor dos mundos possíveis. J (irônico...!)

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CRÍTICAS:

Tese da Compatibilidade: por que não poderão existir relações de produção baseadas em classes capazes de desenvolver as forças produtivas indefinidamente?
Esta versão não pode ser defendida, uma vez que as crises tornam-se inexistentes, pois sempre há adaptações. Há uma irracionalidade no uso da força de produção humana por parte do capitalista.
Tese do Desenvolvimento: é possível que a estabilização seja dada pela superestrutura e não pela mudança das RPs.
Tese da Contradição: se não houver uma classe que queira mudar a situação, nada ocorre.
Tese da Capacidade: as capacidades surgem junto com os interesses, porque as pessoas (racionais) apostarão nas classes que lhes prometem um futuro melhor. As pessoas não tem consciência de sua situação e possuem expectativas razoáveis sobre as consequências que lhes advirão pelo fato de viverem sob relações sociais diferentes.

Bibliografia:
WRIGHT, E. O.; LEVINE, A. & SOBER, E. (1993), Reconstruindo o marxismo: ensaio sobre a explicação e a teoria da história. Petrópolis, Vozes.

Giddens e a Teoria da Estruturação

A teoria da estruturação nasce na mudança do eixo da teoria social dos EUA (com Parsons) de volta para a Europa. Os três conjuntos básicos de questões neste momento, e dos quais a teoria de Giddens se preocupa são:
- ênfase no caráter ativo, reflexivo da conduta humana – rejeição da tendência do consenso ortodoxo de ver o comportamento humano como resultado de forças que os atores não controlam nem compreendem
- atribuição de um papel fundamental à linguagem e às faculdades cognitivas na explicação da vida social
- declínio da importância das filosofias empiristas da ciência natural tem implicações profundas nas ciências sociais
O enfoque do autor é nas sociedades modernas, com grande inclinação sociológica, embora considere sua teoria social e não apenas sociológica.
A principal preocupação da teoria social é idêntica a das ciências sociais: a elucidação de processos concretos da vida social.
O autor considera duas proposições no estudo das ciências sociais:
- a explicação é contextual
- a descoberta de generalizações não é a totalidade nem a finalidade suprema da teoria social
Ou seja, aliando-se as premissas acima, o objeto de estudo pode ser alterado pela própria pesquisa (ou pela ciência social).
A tradição de Parsons, estrutural-funcionalista traz consigo o objetivismo e o naturalismo. Em contraposição àqueles que adotam uma postura subjetivista, influenciados pela hermenêutica e pela fenomenologia.
Na teoria da estruturação, Giddens permite a existência de um sujeito descentrado, mas sem que isso implique a eliminação da subjetividade. A contribuição da linguagem, entretanto, é encarada pelo autor com ressalvas.
Para o autor, agentes ou atores humanos são similares. Possuem como aspecto inerente do que fazem, a capacidade para entender o que fazem enquanto o fazem. As capacidades reflexivas do ator humano estão caracteristicamente envolvidas, de um modo contínuo, no fluxo da conduta cotidiana, nos contextos da atividade social. A reflexividade, entretanto, opera apenas parcialmente num nível discursivo. O que  os agentes sabem acerca do que fazem e de por que o fazem – sua cognoscitividade como agentes – está largamente contido na consciência prática, que está contida em todas as coisas que os atores conhecem tacitamente sobre como “continuar” nos contextos da vida social sem serem capazes de lhes dar uma expressão discursiva direta.
Consciência prática é um dos principais temas do livro e deve ser distinta de consciência (discursiva) e do inconsciente. O autor adota uma versão modificada da psicologia do ego associada ao eu, relacionando-a diretamente com o conceito de rotinização.

O cotidiano é o caráter rotinizado que a vida social adquire a medida em que se estende entre o tempo e o espaço.
O autor diferencia consciência prática, consciência (discursiva) e inconsciência, no seu modelo. O que os agentes sabem acerca do que fazem e de por que o fazem – sua cognoscitividade como agentes – está largamente contido na consciência prática.
Rotinização: vital para os mecanismos psicológicos por meio dos quais um senso de confiança ou de segurança ontológica é sustentado nas atividades cotidianas da vida social. A natureza repetitiva de atividades empreendidas de maneira idêntica dia após dia é a base material do que o autor chama “caráter recursivo da vida social”. 

O Caráter recursivo é, portanto, a natureza repetitiva e idêntica das atividades do dia a dia – recriação constante das propriedades estruturadas da atividade social – via dualidade de estrutura – a partir dos próprios recursos que a constituem.
A rotina introduz uma cunha entre o conteúdo potencialmente explosivo do inconsciente e a monitoração reflexiva da ação que os agentes exigem.
Uma análise goffmaniana, de acordo com Giddens poderia ser a articulação de fenômenos que fazem a discussão do inconsciente: caráter situado da ação no tempo-espaço, rotinização da atividade e a natureza repetitiva da vida cotidiana.

Os indivíduos estão posicionados no fluxo da vida cotidiana, no tempo de vida que é a duração de sua existência e de um tempo institucional, a estruturação supra-individual de instituições sociais (aspecto durkheimiano do pensamento do autor).
Cada pessoa está posicionada em um um modo múltiplo, dentro de relações sociais conferidas por identidades sociais específicas, essa é a principal esfera de aplicação do conceito de papel social.
E não são apenas os indivíduos que estão posicionados (com relação ao outro e com relação a serialidade de encontros no tempo-espaço); os contextos de interação social também estão posicionados.
Os locais não são apenas locais, mas cenários de interação (interacionismo simbólico de Erwin Goffmann).
Regionalização com forte ressonância psicológica – ponto de conexão entre Foucault e Goffman, ambos atribuem grande importância as linhas social e historicamente flutuantes entre ocultamento e revelação, confinamento e exposição.
As mudanças sociais são vistas através de duas perspectivas: sistemas inter-sociais e extremidades do tempo-espaço, que o autor considera as duas componentes do conceito de “sociedade”.
Sistema social: conceito semelhante ao de ecossistema, isto é, é de difícil mensuração e pode ser avaliado por sua “sistemidade”, que acho que pode ser visto como um aspecto de integração dos atores.
Outros conceitos importantes: coerção, estrutura, princípios estruturais. As referencias de análise são as sociedades tribais, as sociedades divididas em classes, os Estados-Nação modernos e sua associação com o capitalismo industrial.
A busca de uma teoria de mudança social é algo condenado.
Conceitos de episódio e tempo mundial, em busca de uma hermenêutica para a mudança social mais adequada que os evolucionismos adaptados (incluindo-se o materialismo histórico).
A teoria da estruturação se ocupa de mudanças relevantes, tais como a formação de cidades em sociedades agrárias ou a dos primeiros estados.


A principal hipótese do projeto é que a mudança do eixo da discussão política para o meio ambiente é uma alteração relevante na teoria social contemporânea.


Bibliografia:
GIDDENS, Anthony. Constituição da Sociedade, A - Editora Martins Fontes, 2003

Teoria Tradicional e Teoria Crítica - Max Horkheimer e Theodor Adorno (1937)

A Ciência Social tem o poder de desconstruir lógicas tomadas como certas. Simplesmente (ou não tão simplesmente assim) demonstrando o quão cultural são as convicções pessoais.
Uma teoria que consegue ir ainda além dessa desconstrução foi preconizada por Horkheimer em 1937. A proposta não poderia ter nome mais adequado que Teoria Crítica.
Proponho abaixo algumas anotações, transcrições e reflexões sobre o brilhante texto de Max Horkheimer.